Bispado

1922 a 1960

Dom Helvécio Gomes de Oliveira

2º Arcebispo de Mariana

Ilustre Educador

Pouco tempo antes de morrer, havia dito Dom Silvério: “Deus há de continuar velando com particular solicitude no provimento de nossa querida Arquidiocese”. Assim que foi dada a notícia da nomeação de Dom Helvécio para seu bispo auxiliar, com direito a sua sucessão, o então Arcebispo, zeloso que era com as coisas da Igreja, teve certeza de que a indicação garantiria a continuação da bela obra da Arquidiocese, iniciada dois séculos antes por Dom Frei Manoel da Cruz.

A felicidade com que a notícia da escolha de Dom Helvécio foi recebida por Dom Silvério pode ser comprovada neste comovente trecho da carta que o próprio enviara ao seu sucessor:

Meu bom irmão e amado coadjutor. Logo que o Ex.mo Sr. Núncio me comunicou em reserva a escolha de Vossa Excelência, eu lhe signifiquei o quanto era feliz e acertada essa eleição. (…) Espero, em breve, ter e abraçar a pessoa de Vossa Excelência, em quem encontrarei verdadeiro amigo para sofrer meus defeitos, emendar meus erros e ajudar-me nas contas que tenho de dar a Deus, implorando a sua misericórdia para mim.[i]

Dom Helvécio Gomes de Oliveira nasceu na área rural de Anchieta, Espírito Santo, em 19 de fevereiro de 1876. Filho de um lar católico, logo cedo foi introduzido nos ensinamentos religiosos. A Palavra de Deus tocara tão cedo o coração do garoto que, aos inacreditáveis três anos de idade, já afirmava para a família a sua vocação sacerdotal.

Iniciou os seus estudos primários ainda em sua terra natal. Aos oito anos, após o falecimento do pai, fora levado para Poços de Caldas pelo padrinho de batismo, o Cônego Quintiliano. Quatro anos depois, em 1888, matricula-se no Colégio Salesiano Santa Rosa, em Niterói. Ao final de quatro anos encerra o curso secundário com notas tão elevadas e comportamento tão admirado, que o Inspetor dos Salesianos à época e bispo de Trípoli, Dom Luis Lasagna, o envia para Europa para que possa aperfeiçoar-se e concluir seus estudos na Casa Mãe da Pia Sociedade. Oportunidade que em muito alegrou o jovem estudante, pois vira nela a chance de ajudar a Santa Obra de Dom Bosco. Antes, se preparou para o novo desafio no Colégio São Joaquim de Lorena, em São Paulo, onde iniciou seu noviciado e seus estudos filosóficos.

Em 05 de abril de 1894, vestiu a batina na Basílica de Santa Maria Auxiliadora em Turim, tendo-a recebido pelas mãos do sucessor de Dom Bosco, o servo de Deus, Dom Miguel Rua. Em Roma, na Universidade Gregoriana, recebeu o grau de bacharel em Filosofia.

De volta ao Brasil, foi designado para as missões do Mato Grosso. Tantas eram suas qualidades e méritos que, apenas um ano após sua ordenação, fora feito diretor do Liceu do Mato Grosso, importante educandário para jovens. Na direção do colégio, procurou seguir os ensinamentos daquele que fora o maior educador do século XIX, o venerado Dom Bosco. Assim fazendo, Dom Helvécio elevou bastante as virtudes do estabelecimento. Modelou a disciplina, aperfeiçoou o método de ensino e de estudos e levou para lá exímios professores para todas as matérias.

Em Mato Grosso, dedicou-se também com entusiasmo à imprensa. Foi ele o fundador do jornal “Mato Grosso” e da revista “Mato Grosso”, onde escreveu inúmeros artigos que atestam a vastidão de seus conhecimentos em diversas áreas do saber.

Em 1900, o então padre Helvécio fundou, em Cuiabá, um observatório meteorológico que, ao longo de anos, prestou inúmeros e valiosos serviços aos estudos do clima em São Paulo, Rio de janeiro e Buenos Aires. Em 1903, foi transferido para São Paulo, onde assumiu, na qualidade de secretário, a Inspetoria Maria Auxiliadora. Seus irmãos salesianos, ainda naquele ano, o elegeram representante brasileiro de toda a Ordem no Encontro Geral da Congregação em Turim, ocasião em que era o mais jovem dos participantes, o que não o impediu de debater, em mesmo nível, com os salesianos mais destacados do mundo.

Em seu retorno ao Brasil, foi trabalhar no Liceu do Sagrado Coração de Jesus, também em São Paulo. Nessa época, foi o responsável pela revista “Santa Cruz”, uma das mais renomadas da imprensa brasileira de então. Entre 1911 e 1913, foi professor de português no Colégio de Lorena.

Recebeu com muita alegria a missão que lhe foi confiada, a partir de 1814, de auxiliar o diretor do colégio de sua infância, o Santa Rosa de Niterói, a reerguer a Instituição, que vinha de um período de extremas dificuldades. Serviu sucessivamente à causa como professor, conselheiro escolar e finalmente prefeito do Colégio, onde mais uma vez ficaram destacados a sua capacidade de administrar e o seu talento e prazer em lecionar e educar.

Quando ao final de 1917, fora apontado seu nome para o episcopado, declarou não ter desejo de sagrar-se bispo. Mas foi surpreendido com a não aceitação de sua recusa, por parte da Santa Sé, e por sua eleição para bispo de Corumbá, confirmada por bula do papa Bento XV, de 15 de fevereiro de 1918. Mais uma vez declinou da nomeação, mesmo sendo insistentemente convidado pelos seus antigos conhecidos da época do Liceu e por autoridades do Estado de Mato Grosso.

Mas, ao ser nomeado sucessor de Dom Silva na diocese do Maranhão pelo Santo Padre, não lhe foi mais possível protelar sua sagração que tanto evitara por humildade e por desejo de continuar sua missão educadora.

Foi sagrado bispo em Niterói, então capital fluminense, em uma concorrida e extraordinária solenidade, onde se fizeram presentes autoridades e representantes da sociedade fluminense e maranhense, além de setores da imprensa nacional.

Oito dias após sua chegada ao Maranhão, realizou sua entrada solene na Catedral de São Luís. Foi recebido pelo povo maranhense com entusiasmo ímpar, em uma festa classificada pelos jornais de São Luís da época como de proporções extraordinárias.[ii]

Seu episcopado no Maranhão durou quatro anos. Com seu perene e bondoso sorriso e admirável capacidade para o trabalho, soube conquistar a afeição de todos aqueles que com ele conviveram e daqueles de quem foi líder espiritual. Sobre seu período na Igreja do Maranhão, são bastante ilustrativas as palavras de Fran Pacheco, autor de Geografia do Maranhão, em 1923, nas páginas 419 e seguintes, da referida obra:

De espírito democrático, alma aberta a todas as iniciativas, estranho a preconceitos risíveis, o insigne bispo, zelando sempre os foros de sua categoria, nunca se dedignou de estender a mão amiga aos subalternos hierárquicos e nem de abraçar os mais modestos dos profanos.[iii]

Foi o principal responsável pelas obras de restauração da catedral de São Luís, realizadas ao longo de 1922. Em abril do mesmo ano, um levante dos militares maranhenses culminou com a deposição do então presidente do Estado, Dr. Raul da Cunha Machado. Coube a Dom Helvécio desenvolver a ação necessária para a conciliação e pacificação dos ânimos na capital maranhense. Comunicou-se com o governo federal que restabeleceu a ordem pública e reconduziu ao poder a legítima autoridade constituída.

Graças aos seus esforços, em 1921, o papa Bento XV elevou a diocese do Maranhão a Arcebispado, o que foi ratificado por bula do papa Pio XI, em fevereiro de 1922. Por meio da mesma bula, o Santo Padre comunicava a eleição de Dom Helvécio para bispo auxiliar com direito à sucessão da Arquidiocese de Mariana. Partiria de São Luís em 12 de setembro do mesmo ano, deixando o povo maranhense, com certeza, triste pela despedida, mas também agradecido pelos quatro anos de uma obra irreparável tanto no aspecto espiritual como administrativo.

Por não lhe ter sido possível assumir posse como bispo auxiliar, com Dom Silvério ainda em vida, tornou-se necessária a edição de nova bula para que a sucessão fosse formalizada. Fato que ocorreu em 10 de novembro de 1922, menos que três meses após o falecimento do primeiro arcebispo de Mariana. A entrada solene de Dom Helvécio à catedral da Sé se deu em 26 de novembro do mesmo ano, data em que foram registradas brilhantes festividades em alusão ao importante acontecimento. Havia o arcebispo saído do Rio na manhã do dia 25, pernoitando em Ouro Preto e chegando a Mariana, por trem especialmente reservado a ele por católicos ouro-pretanos. Em toda a viagem desde o Rio de Janeiro, por onde o trem que o levava passasse, grandes demonstrações de alegria e boas-vindas lhe foram transmitidas pelos mineiros. Foi assim nas estações de Matias Barbosa, Juiz de Fora, Barbacena e em todo o circuito da Central do Brasil. Em Mariana, foi recebido com entusiasmo, desfilou pela rua Direita e, em todo percurso, era saudado pelas famílias que, das sacadas, lhe atiravam pétalas de flores.

Logo no começo de seu episcopado, iniciou visita geral que encerraria em pouco mais de cinco anos. Neste tempo, início da década de 20 do século XX, a Arquidiocese de Mariana, somava cento e sessenta paróquias e já havia sido desmembrada em meia dúzia de dioceses. Dom Helvécio trabalhou pela criação da diocese de Juiz de Fora e da de Leopoldina, realizadas respectivamente em 1924 e 1942.

Por ocasião do ano jubilar de 1925, esteve em Roma, onde foi recebido pelo Santo Padre Pio XI, ocasião em que visitara também Lourdes. Durante essa viagem, recebeu o título honorário da Universidade de Letras e Ciências de Nápoles. Em seu regresso ao Brasil, em entrevista ao jornal “O Paiz”, de 6 de dezembro de 1925, disse que profunda tristeza havia sentido no velho mundo ao perceber que por lá muito pouco ou praticamente nada se sabia sobre o Brasil, a não ser visões equivocadas sobre nossos indígenas, e ainda acrescentou:

Francamente, muito pouco temos que aprender no velho mundo, pois em matéria de liberdade, por exemplo, estamos muito mais adiantados. Isso afirmo com testemunho pessoal, pois em certos países que visitei observei regimentos despóticos, ódios abafados pela força do poder, enfim, uma série de fatos dessa natureza que levam a gente a acreditar que estivesse vivendo sob a pressão de tiranos (…)[iv].

Uma análise das palavras do bispo pode levar a conclusão de que, sábio como era, já previa os terríveis anos de despotismo e guerra em que o velho continente estava prestes a entrar. Já sobre Pio XI, disse que o mesmo se referiu com muito carinho ao Brasil e que se mostrou interessado pelos detalhes da vida no país. Ao fim da entrevista, Dom Helvécio se revelou feliz com a viagem, pois acreditava ter conseguido sacerdotes e freiras para vi- rem ao Brasil atuar como missionários.

Em 1926, o Santo Padre Pio XI lhe concederia o honroso título de Conde Romano e Assistente ao Sólio Pontifício, dignidade muito rara e concedida apenas em ocasiões excepcionais e a pessoas de igual qualidade. Por essa ocasião, escreveu o papa:

Seguindo o exemplo dos Romanos Pontífices, nossos predecessores, so- mos solícitos em distinguir com títulos particulares e privilégios os Prelados merecedores por seu zelo na propagação da Fé Cristã e os pastores de almas extremamente dedicados ao bem do rebanho que lhes foi confiado. Entre estes não podemos duvidar que mereçais ser contado, vós que sabiamente governais a Arquidiocese de Mariana…[v]

O imenso zelo, reservado por Dom Helvécio ao patrimônio artístico da Arquidiocese ficou patente desde o início de seu arcebispado. Com atitudes enérgicas e inteligentes, coibiu o tráfico das obras de arte religiosa. Em 03 de maio de 1926, publicou a Pastoral do Episcopado mineiro sobre o patrimônio artístico. Considerado o primeiro e veemente brado em defesa da arte religiosa mineira, o documento é o marco inicial do desenvolvimento da cultura de preservação do patrimônio artístico em Minas Gerais. Fundou, em Mariana, o Museu de Arte Sacra, formado por um acervo riquíssimo, mais tarde doado pelo próprio arcebispo ao Museu da Inconfidência de Ouro Preto, quando da fundação deste último.

Durante a Revolução de 30, quando o movimento liderado por Getúlio Vargas já estava a poucos passos da vitória, o 11º Regimento do Exército insistia em resistir em São João del-Rei. Para evitar mais mortes, Dom Helvécio não temeu arriscar sua própria vida e se dirigir ao palco das operações de guerra naquela cidade. Lá, entre os militares, soube usar as palavras certas e convencer os combatentes a depor as armas.

Ficou famosa a forma carinhosa com que Dom Helvécio sempre se dirigiu aos operários. Esteve em Ipatinga, então a mais distante das paróquias da Arquidiocese, para abençoar a pedra fundamental da Usiminas, ocasião em que, como em muitas outras, fez questão de ressaltar a nobreza do trabalho daqueles homens que, tal como os pioneiros mineradores de séculos atrás, dedicavam os melhores anos de suas vidas, trabalhando arduamente pelo desenvolvimento e engrandecimento da pátria, muitas vezes colocando em risco sua saúde e sem receber da sociedade o justo reconhecimento.

Nem mesmo as variadas obrigações e tarefas administrativas e espirituais de um arcebispo fizeram com que Dom Helvécio abandonasse sua missão educadora. Nessa área, realizou portentosa obra que muitos benefícios trouxe a Minas Gerais e ao Brasil. A ele se devem a construção e fundação de importantes centros de educação, como o Colégio Arquidiocesano de Ouro Preto e o Colégio Dom Helvécio de Ponte Nova. Em sua terra natal, Anchieta, fundou, em 1932, a primeira escola do interior do Espírito Santo, a Escola Normal Maria Matos, dirigida pelas Irmãs Carmelitas que ainda hoje seguem realizando a missão destinada à ordem pelo Arcebispo Dom Helvécio. Muitos outros educandários surgiram de seu ímpeto educador, como o Ginásio dos Jesuítas, também de Anchieta, a Escola Angélica de Coronel Fabriciano, as escolas Normais Nossa Senhora do Carmo de Caratinga e Cataguases, o Ginásio São João, em São João del-Rei, o Ginásio de João Monlevade. Todas essas instituições tornar-se-iam importantes para o desenvolvimento de cada região onde fora fundada, dando razão às iniciativas do Arcebispo que queria e conseguiu dar sua contribuição para levar educação e cultura também ao interior do Brasil.

O governo brasileiro lhe concedeu, em decreto de 30 de julho de 1951, o título de grande Oficial da Ordem ao Mérito, por seus serviços e pelo enriquecimento espiritual da nação, em concorrida solenidade em São João del-Rei, quando o então governador de Minas, Juscelino Kubistcheck, em nome do presidente da República Getúlio Vargas, lhe entregou o diploma e a insígnia e o conclamou digno dos mais excepcionais títulos e honrarias da pátria, por sua notável obra educacional que beneficiou e beneficiava milhares de jovens brasileiros[vi].

Dentre todas as suas realizações, certamente as que mais dedicação e carinho receberam de Dom Helvécio foram aquelas relacionadas ao aprimoramento e ao cultivo das vocações sacerdotais. Não por acaso fora aclamado “Arcebispo das Vocações”.

Ainda no início de seu Episcopado, instituiu, em Mariana, a Obra dos Pequenos Acólitos, chamada carinhosamente por ele de “Meu pequeno clero”, for- mado em sua maioria por jovens aspirantes à vida sacerdotal de famílias pobres. Certamente a sua maior obra nessa área foi a construção do Seminário Maior São José que inaugurou uma nova era para o tradicional Seminário de Mariana. A obra de 1934 hoje abriga o curso de teologia do Seminário e é refe- rência em todo o Brasil na formação de clérigos.

Outra área onde o trabalho de Dom Helvécio deve ser celebrado é na defesa da preservação ambiental. Em uma época em que a preocupação ecológica ainda estava longe de ser uma das grandes questões mundiais e que o ímpeto desenvolvimentista difundido por toda a nação ignorava “senões”, coube ao estimado prelado chamar a atenção da sociedade mineira para o perigo da destruição indiscriminada das reservas naturais. Ainda nos anos trinta, Dom Helvécio iniciou seus esforços pela criação de uma área de preservação na região do Rio Doce, onde se iniciava o desenvolvimento da vocação siderúrgica, que viria a fazer da região uma das mais prósperas do Estado a partir do terceiro quarto do século vinte, mas que, naquele momento, avançava pelas matas ameaçando seriamente o equilíbrio ecológico. Em 1944, para alegria de Dom Helvécio, foi criado o Parque Nacional do Rio Doce, uma das mais extensas e importantes áreas de preservação de mata virgem, da fauna e da flora de Minas Gerais. Esses esforços lhe renderam a alcunha de o “Bispo das Matas”. Em sua homenagem, foi batizada a maior, a mais bela e famosa das muitas lagoas do parque, a lagoa “Dom Helvécio”, popularmente conhecida como a “lagoa do bispo”. A partir de 1937, aos sessenta e um anos de idade, o arcebispo passou a sofrer de constantes problemas relacionados à saúde. Nesse citado ano, foi obrigado a ausentar-se da cidade episcopal por cinco meses para submeter-se a uma intervenção cirúrgica para extração de um tumor benigno, realizada no Rio de Janeiro. Quando tal notícia se espalhou pela Arquidiocese, o povo mineiro demonstrou-se extremamente comovido e dedicou ao seu arcebispo incontáveis preces, promessas e novenas. Foi um período de bastante apreensão por parte dos fiéis mineiros. O retorno de Dom Helvécio a Mariana foi saudado com inúmeras demonstrações de júbilo pelos populares, por segmentos sociais e autoridades tanto políticas quanto eclesiásticas de todo o país.

Com o passar dos anos e o avanço da idade, os períodos de internações e cirurgias se repetiam, motivando sempre a comoção e a solidariedade por parte dos mineiros. Nem mesmo a fragilidade de seu corpo seria capaz de lhe retirar a disposição com a qual sempre procurou realizar sua missão. Ao contrário, fez dela um exemplo diário de devoção e fé.

AArquidiocese de Mariana, ao longo de sua história, contou com a grata atuação de três grandes bispos auxiliares. O primeiro, ainda nos tempos de diocese, foi Dom Silvério, entre 1890 e 1896, no episcopado de Dom Benevides. Dom Modesto Augusto Vieira serviu a Dom Silvério, entre 1914 e 1916. Dom Helvécio pôde contar com a fiel e inestimável ajuda de Dom Daniel Tavares Baeta Neves, como seu bispo auxiliar, por durante 11 anos, a partir de 1947. Coube a Dom Daniel, fazer-se presente quando o Arcebispo encontrava-se impossibilitado por motivos de saúde ou, em razão de seus inúmeros compromissos fora da província eclesiástica de Mariana. O Monsenhor Flávio Carneiro Rodrigues, em obra comemorativa aos 250 anos da diocese, de 1995, destaca a atuação dos bispos auxiliares de Mariana e lhes presta agradecida homenagem:

Admira e conforta observar que, em suas preocupações e iniciativas, muito tiveram em comum com os Bispos (titulares), na condução da grei marianense. Foram traços marcantes e tradicionais de seus episcopados: uma devoção acentuada à Virgem Maria; acatamento filial ao Romano Pontífice; cuidado com o Seminário, com seu clero e com as vocações; o zelo com a integridade da mensagem evangélica pela pregação e pela catequese; a atenção carinhosa com os pobres; o empenho com a educação da juventude. Quase todos, tendo sido mestres e doutores, souberam prestigiar a cultura sacra e profana, ampararam as artes, favoreceram os estudos e as letras. Mais que tudo experimentaram aquele prazer de proclamar o Evangelho, aquela alegria de anunciar Jesus Cristo Crucificado, Redentor; entusiasmo que primeiro foi de São Paulo e que deu ciência disto aos irmãos de Corinto.[vii]

Em 1959, seria eleito bispo coadjutor sede plena de Dom Helvécio, com direito à sua sucessão, um velho amigo, Dom Oscar de Oliveira, de quem havia sido protetor e benfeitor conforme o próprio escreveria em carta de 12 de março de 1959:

O menino pobre que Dom Helvécio acolheu caridosamente em seu Seminário, a 21 de abril de 1925, que, em outubro de 1933, foi por ele enviado a Roma para concluir o curso teológico e fazer o de direito canônico; o jovem sacerdote laureado que o Sr. Arcebispo nomeou professor de direito no Seminário Maior, em março de 1938 e que, em 2 de fevereiro de 1944, o honrara com o canonicato fazendo-o cura da catedral; o cônego que S. Excia. sagrara bispo a 22 de agosto de 1954, era aquele que a Providência divina elegera para “baculum senectutis et juventutis” de seu próprio Metropolita.[viii]

Em 1º de abril de 1960, às vésperas da Semana Santa, Dom Helvécio chega a Coronel Fabriciano, vindo de sua cidade natal, Anchieta. Era um notório amigo da região, onde além de ter lutado pela criação do Parque Nacional do Rio Doce, havia fundado escolas e agido por diversas vezes junto às autoridades do Estado pela incrementação da infraestrutura urbana das cidades que a compunha. Assim sendo, suas visitas àquela região eram sempre muito comemoradas pelas populações das cidades e daquela vez não seria diferente. O que ninguém sabia ou não queria crer é que aquela seria a última das visitas pastorais do querido Arcebispo.

Desde sua chegada a Fabriciano, ficou evidente para quem com ele se encontrava que as suas condições físicas estavam por demais fragilizadas pela doença. Falava pouco e, quando o fazia, revelava a voz fraca e sua dificuldade de expor com clareza e sentido as idéias.

No dia 10 de abril, um Domingo de Ramos, mesmo com muita dificuldade, celebrou missa na fazenda Bom Jesus. Nos próximos dias, seu estado de saúde deteriorava rapidamente, causando a comoção de todos que o visitavam. Ao saber das tristes novas, Dom Oscar se dirige à cidade, a fim de estar com o velho amigo, naqueles que seriam os momentos de seu crepúsculo.

Dom Oscar chegou no sábado santo e sentiu profunda tristeza ao ver que a doença havia levado do velho Arcebispo sua outrora prodigiosa consciência. Não foi possível a Dom Helvécio sequer reconhecer seu amigo e bispo coadjutor.

No domingo de Páscoa, já praticamente inconsciente, Dom Helvécio recebe de Dom Oscar a extremaunção. Seu corpo encontravase quase totalmente paralisado, de forma que nem se alimentar era possível. O sofrimento do amado Prelado ainda se prolongaria por oito dias.

Dom Helvécio Gomes de Oliveira, segundo Arcebispo de Mariana, faleceu em 25 de abril de 1960, ladeado por amigos, admiradores e autoridades. Morreu pobre, pois para si jamais guardou algo. As terras que lhe foram deixadas pelos pais foram por ele doadas, em testamento, às irmãs Carmelitas para que a Congregação pudesse edificar em Anchieta, um educandário. Na madrugada do dia 26, uma multidão acompanhou a missa de corpo presente de dentro da Igreja Matriz e outra se postou à porta do templo durante todo o tempo da celebração. No dia seguinte, o cortejo fúnebre se dirigiria à cidade episcopal de Mariana, onde o Arcebispo seria, com todas as honras, sepultado.

Fonte: SANTIAGO, Marcelo Moreira. et al. Igreja de Mariana. 261 anos de história. 100 anos como Arquidiocese: 1906-2006. Mariana: Gráfica Dom Viçoso, 2007, p. 91-106.

[i] Trecho extraído do periódico “MINAS GERAIS”, de 24 de novembro de 1922. p.9.

[ii] TRINDADE, Cônego Raymundo. Arquidiocese de Mariana – subsídios para sua história. Mariana: Escolas Profissionais do Liceu Coração de Jesus, 1929. v.3. p.1404.

[iii]  Ibidem. p.1410.

[iv] O PAIZ. 06 de dezembro de 1925. p. 09.

[v] Trecho extraído de carta endereçada ao então presidente da República, Getúlio Dornelles Vargas, pelo cabido de Mariana, por ocasião do cinquentenário da ordenação de Dom Helvécio, datada de 10 de Julho de 1951. (Arquivo Eclesiástico da Arquidiocese de Mariana – Arquivo 05 – Gaveta 03 – Pasta 07)

[vi] O ARQUIDIOCESANO. 1º de maio de 1960. Mariana – MG. p. 04.

[vii] RODRIGUES, Monsenhor Flávio Carneiro. Arquidiocese de Mariana, 250 Anos. 1995. p. 07.

[viii] Trecho extraído da carta de Dom Oscar de Oliveira, em 12 de março de 1959. “Arquivos Eclesiásticos da Arquidiocese de Mariana”. Arquivo 05, gaveta 03, pasta 14.

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